Foram 14 localidades do estado com atendimentos simultâneos, levando serviços públicos relevantes como pensão alimentícia, realização de exame de DNA e divórcio
Cerca de 31 quilômetros separa a casa de Renata Farias da unidade mais próxima da Defensoria Pública da Bahia – DPE/BA. Isso impedia a moradora de Jambeiro, em Lauro de Freitas, de garantir a pensão alimentícia do seu filho. Contudo, na última terça-feira (18), ela só precisou atravessar a rua para acionar a justiça e assegurar seus direitos. No mesmo dia, mas no distrito de Humildes, em Feira de Santana, Dina Souza não precisou se deslocar por 18 quilômetros até a 1ª Regional para tirar uma dúvida sobre união estável. Na comunidade indígena Aldeia Águas Belas, em Prado, um casal indígena conseguiu, após 30 anos juntos, oficializar sua união sem precisar sair de sua aldeia. Todas estas histórias puderam ser contadas graças a ação Interioriza Defensoria, que encurtou a distância entre povoados desassistidos e a Justiça.
Com o projeto Interioriza Defensoria, realizado na última terça-feira (18), a DPE/BA realizou o segundo grande mutirão de acesso à Justiça, indo até populações que moram em locais longínquos das sedes da instituição. Foram 14 localidades do estado com atendimentos simultâneos, com serviços públicos relevantes como solicitações de regularização de documentos, pensão alimentícia, realização de exame de DNA, divórcio, reconhecimento ou dissolução de união estável, entre outros. Este ano, o projeto somou mais de 1.052 atendimentos. Em maio, foram 754 pessoas beneficiadas.
No Extremo Sul da Bahia, a 14ª Regional da Defensoria Pública da Bahia, sediada em Teixeira de Freitas, foi à comunidade indígena Aldeia Águas Belas, em Prado. Cerca de 125 famílias e 310 pessoas vivem na localidade, de acordo com a associação comunitária local. Diversas aldeias abraçaram o Interioriza Defensoria e foram até o local: Mucugê, Canto da Mata, Craveiro, Corumbauzinho, Monte Dourado e Tauá, além de pessoas de Corumbau e moradores rurais da região.
A ação aconteceu na Escola Indígena Bom Jesus, onde 327 demandas foram encaminhadas em apenas um dia de projeto. “Nossas atuações foram feitas, majoritariamente, na área de registros públicos, com serviços de primeira e segunda via de RG, mas também fomos procurados para questões relacionadas às ações de família. O espaço ficou lotado e registramos muitos atendimentos”, avaliou o coordenador da 14ª Regional, Caio Cruz.
Na área de família, houve busca por pensão alimentícia, guarda dos filhos e reconhecimento de união estável, como ocorreu com o casal Ivonete Passos do Nascimento, 63 anos, e Teotônio Eufrásio Santana, 69 anos, que vieram da Aldeia Mucugê para buscar o reconhecimento da união estável, iniciada há mais de 30 anos.
“Nós nos juntamos no dia 1º de novembro de 1989. Não casamos com papel passado, por isso que estamos aqui hoje. Quero que fique registrado no documento todos os anos em que estamos juntos”, disse Ivonete. Ela e Teotônio explicam que souberam do atendimento da Defensoria Pública por meio do cacique Gil, também da aldeia Mucugê. “Nós pensamos que não podíamos perder a oportunidade de fazer a nossa união estável, pois nós não temos condições de pagar por isso. O preço é alto para nós”, afirmou Teotônio. A defensora pública Ana Carolina Lugullo explicou que foi necessário contatar o cartório de Prado para que a história do casal fosse, enfim, oficializada. “Foi necessário expedir ofício para o cartório sinalizando que eles querem reconhecer a união estável para que, futuramente, todos os seus direitos possam ser assegurados”, disse.
Há 31 anos que Paulo Sérgio, conhecido como Paulo Borracha, veio para a comunidade de Águas Bela, onde construiu a sua família e passou a conhecer mais sobre os direitos dos povos indígenas. Hoje, aos 51 anos, é presidente da Associação Comunitária Indígena Águas Belas Bom Jesus e foi um dos articuladores para a vinda da Defensoria da Bahia à localidade. “É uma dificuldade grande sair daqui da comunidade para ir até a cidade tirar nossos documentos. E essa parceria com a Defensoria Pública foi muito importante para trazer melhorias para todas as comunidades daqui de Prado e do distrito de Barra Velha”, avaliou Paulo Borracha.
Lauro de Freitas
Simone Barbosa dos Anjos procurou atendimento na segunda edição do Interioriza Defensoria para realizar um sonho. Diferentemente das outras mulheres ali presentes, que, em sua maioria, lutavam pelo direito à pensão alimentícia ou por benefícios sociais, ela desejava incluir o nome do filho falecido na certidão de nascimento do neto, ainda bebê à época que o pai faleceu.
Dona Simone perdeu o filho de 20 anos em 2017 e desde então sonha que o neto, hoje com sete anos de idade, tenha em seus documentos a identificação da família paterna. “Aquela criança é minha paixão. Eu o amo demais. Agora, faremos o exame de DNA e ele também terá o sobrenome da nossa família”, afirmou, esperançosa. Ela e outras dezenas de pessoas foram atendidas no bairro Jambeiro, em Lauro de Freitas.
Renata Farias, 38 anos, só precisou atravessar a rua para conseguir atendimento. Ela soube do mutirão pelo WhatsApp e não perdeu tempo. “Nem sempre tenho dinheiro para o transporte. Então, o atendimento aqui foi bom demais”, afirmou. Ela aproveitou a facilidade para atualizar o processo que move contra o pai de um de seus filhos, de quem cobra pensão alimentícia. “Só recebo algum dinheiro quando vou atrás dele. Mas eu não quero ficar indo atrás dele não. Quero que ele pague certinho”, explicou.
Renata é usuária antiga da Defensoria. Em 2016, obteve o reconhecimento do filho via DPE/BA, por meio de exame de DNA. Em 2017, ingressou com ação por pensão alimentícia e, a partir daí, volta e meia precisa de atendimento para cobrar o efetivo cumprimento da medida judicial.
De acordo com a defensora Juliane Andrade, coordenadora da 7ª Regional, sediada em Camaçari, o direito de família é o carro-chefe dos atendimentos da Defensoria. Ela considerou essa edição do Interioriza “um sucesso”, com um aumento considerável da procura por serviços, em comparação à primeira edição. “É muito importante a continuidade do Interioriza, porque é a oportunidade da população vulnerável, que tem dificuldade de se deslocar, de acessar serviços jurídicos, direitos e garantias”, afirmou.
Feira de Santana
Chegar até a Defensoria era mais fácil para Dina de Souza, de 63 anos, mas na época em que ela ainda morava em Feira de Santana, quando precisou pela primeira vez dos serviços da instituição por conta da violência doméstica que sofreu. Há alguns anos, entretanto, ela se mudou para o distrito de Humildes, a cerca de 18 quilômetros da cidade e passou a ter um custo mais alto para chegar até a sede da 1ª Regional da DPE/BA.
Com o projeto Interioriza Defensoria, realizado no Colégio Padre Henrique Borges, a distância entre Dina e a DPE/BA foi mais uma vez encurtada. “Mesmo o atendimento sendo gratuito tem o transporte, tem o lanche, sempre tem um custo. Sendo aqui perto de mim foi uma coisa maravilhosa e com o mesmo atendimento caloroso de sempre”, explicou Dina. Ela estava há dias com uma dúvida para ser sanada sobre a união estável com o seu agressor e com o Interioriza conseguiu superar mais uma angústia.
“Eu tenho uma união estável há mais de vinte anos e ouvi um boato que, mesmo eu estando me separando, se eu comprasse algo agora, ele ainda teria direito. Então, eu vim ter esse esclarecimento se é assim mesmo, ou não. Mas, graças a Deus, essa informação era falsa”, completa.
Em sua saudação inicial ao público, servidoras, servidores, defensoras e defensores públicos presentes no distrito em Feira de Santana, a defensora-geral, Firmiane Venâncio, destacou o potencial do projeto em capilarizar os serviços da Defensoria em boa parte do estado.
“O Interioriza leva a Defensoria Pública a quem não está próximo dos grandes centros, quem não está na sede de uma comarca, e que precisa de um atendimento jurídico, de uma orientação, seja para resolver os problemas relacionados a área de família, alguma questão em relação ao direito de vizinhança, investigação de paternidade, ou mesmo regularizar documentação para desenvolver outros aspecto da cidadania”, explica a DPG.
CONFIRA TODOS OS LUGARES QUE FORAM BENEFICIADOS PELO INTERIORIZA DEFENSORIA
1ª Regional
Local: Colégio Estadual do Campo Padre Henrique Borges, rua Cônego Olimpo, s/n, distrito de Humildes, Feira de Santana
2ª Regional
Local: Escola Municipal Alfredo Brito, comunidade quilombola de Lagoa de Maria Clemência, s/n, distrito de Pradoso, zona rural de Vitória da Conquista
3ª Regional
Local: Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) do Banco da Vitória, rodovia Ilhéus-Itabuna, 531, bairro Banco da Vitória, Ilhéus
4ª Regional
Local: Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) II Nova Ferradas, rua Bela Vista, 257, bairro Nova Ferradas, Itabuna
5ª Regional
Local: Teatro Municipal José Guilherme da Cunha, distrito de Juremal, zona rural de Juazeiro
6ª Regional
Local: Prefeitura Municipal de São Felipe, praça Cônego José Lourenço, 42, bairro Centro, município de São Felipe
7ª Regional
Local: Escola Municipal Amauri Siqueira Montalvão, estrada Areia Branca-Cachoeirinha, bairro Jambeiro, município de Lauro de Freitas
8ª Regional
Local: Galpão da Igreja Católica, comunidade Rio de Pedras, zona rural de Barreiras
9ª Regional
Local: Escola Municipal Dois de Maio, assentamento Chico Mendes, zona rural de Porto Seguro
10ª Regional
Local: Auditório Municipal Paulo Magalhães, na praça Pedro Batista, bairro Centro, município de Santa Brígida
11ª Regional
Local: Escola Januário Alves, povoado de Ramos, zona rural do município de Presidente Dutra
12ª Regional
Local: Centro Educacional Leur Lomanto, rua Florestal, s/n, distrito de Itaibó, zona rural de Jequié
13ª Regional
Local: Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) do Riacho da Guia, rua Alexandre Fonseca, 35, zona rural de Alagoinhas
14ª Regional
Local: Comunidade indígena Aldeia Águas Belas, no território de Barra Velha, no município de Prado
Fonte: DPE-BA
Foto ilustrativa.