“A LGPD é extremamente relevante para a sociedade e indispensável à atividade dos Registradores Civis das Pessoas Naturais”

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Monique Fernandes é advogada da Arpen/BA

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) – 13.709/2018, que recentemente completou 3 anos de vigência e 5 anos de sanção e publicação, trouxe um novo sentido para o debate sobre a proteção e tratamento de dados pessoais. A norma, que está em vigor desde agosto de 2020, estabelece padrões para o tratamento dessas informações.

Monique Fernandes é formada pela Faculdade Ruy Barbosa (Centro Universitário UniRuy – Wyden), é pós-graduada em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Ufba. Desde 2019 atua pela Arpen/BA em prol dos interesses da classe dos Registradores Civis das Pessoas Naturais do Estado da Bahia, atuando perante o Tribunal de Justiça da Bahia, Conselho Nacional de Justiça, Supremo Tribunal Federal, Fundo Especial de Compensação, dentre outros órgãos.

Leia abaixo a entrevista exclusiva concedida pela advogada e pós-graduada em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, Monique Fernandes:

  1. Arpen/BA – Em vigor desde setembro de 2020, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), estabelece regras e diretrizes para a coleta, armazenamento, processamento e compartilhamento de dados pessoais no país. Qual a importância da LGPD na atuação dos registradores civis?

Monique Fernandes – A nossa Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD teve origem na General Data Protection Regulation – GDPR, lei europeia, em decorrência de uma mudança de cultura. Com a globalização e o avanço da tecnologia, os dados pessoais estão cada vez mais expostos e, pode-se dizer, valiosos. Com o movimento mundial de frear o compartilhamento indiscriminado de dados, o Brasil precisou se adequar à nova cultura em construção, a fim de viabilizar a manutenção das relações com outros países, por exemplo, entre Governos ou em negócios entre empresas. Outros países, sobretudo, europeus, deixariam de estabelecer negócios e relações com o Brasil, caso o país não instituísse regramento seguro e garantias de proteção aos dados tratados. Como é sabido, no Brasil, a maioria dos dados podia ser compartilhada livremente, inclusive, comercialmente. É extremamente comum o fornecimento de inúmeros dados, inclusive desnecessários, para a obtenção de qualquer produto ou serviço, participação em promoções, visitas a estabelecimentos ou em ações simples do dia a dia, culminando, muitas vezes, nos indesejáveis e-mails (spam), ligações de Telemarketing ou, ainda pior, tentativas de golpes e fraudes.

A LGPD, portanto, é extremamente relevante para a sociedade e indispensável à atividade dos Registradores Civis das Pessoas Naturais. Certamente, os Oficiais da Cidadania, guardiães de incontáveis dados pessoais, exercem uma das funções mais importantes e relacionadas à LGPD. A Lei n. 13.709/2018, associada ao Provimento CNJ n. 134, de 24/08/2022, que tratou especificamente da LGPD para os Cartórios, ampliou a segurança jurídica e estabeleceu diretrizes para a atuação mais segura dos delegatários. A implementação da LGPD nos Cartórios exige o empenho de todos os atores, representando uma alteração gradual de consciência e hábito, o que beneficia o usuário e a própria serventia na organização da atividade e guarda do acervo e demais dados tratados.

Sem dúvidas, a LGPD orienta e resguarda ainda mais a missão dos Oficiais da Cidadania, que precipuamente devem proteger dados dos cidadãos, inclusive, muitos deles, dados sensíveis.

2. Arpen/BA – Quais são as principais mudanças que os cartórios precisaram fazer em suas práticas para a plena adequação à LGPD?

Monique Fernandes – A plena adequação à LGDP é um processo longo e contínuo. Os Cartórios tiveram que implementar desde as medidas mais simples descritas na Lei e no Provimento supracitados, até os procedimentos mais complexos. Cabe mencionar que, de logo, os delegatários precisaram compreender o seu papel de Controlador e as responsabilidades decorrentes dessa função. Em seguida, nomearam ao menos um Encarregado e elaboraram relatórios exigidos pelos aludidos regramentos. Foi necessária a realização do Mapeamento das Atividades de Tratamento, disposto no Capítulo III, do Provimento CNJ n. 134/2022, para a perfeita compreensão do fluxo de dados nas respectivas Serventias, e a atualização periódica desse Mapeamento. Os Cartórios passaram a atuar de maneira ainda mais transparente, disponibilizando todas as informações devidas aos usuários, de forma acessível, gratuita e de fácil entendimento. Ademais, criou-se uma dinâmica de tratamento de dados ainda mais rigorosa e segura. Os Cartórios passaram a formular regras de boas práticas e de governança, tal como descrito na lei. Por fim, também em atenção ao ordenamento, os Registradores estão buscando capacitação para eles e seus prepostos, realizando ainda treinamentos periódicos.

3. Arpen/BA – Quais são as penalidades previstas pela LGPD em caso de descumprimento por parte dos cartórios?

Monique Fernandes – As sanções administrativas estão previstas na Seção I, do Capítulo VIII, da Lei n. 13.709/2018 (LGPD). Consoante disposição legal, às sanções administrativas poderão ser aplicadas pela autoridade nacional, em razão das infrações cometidas às normas previstas na LGPD. O artigo 52, da lei em comento, elenca as seguintes sanções:

I – advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; (aplicável aos cartórios)

II – multa simples, de até 2% (dois por cento) do faturamento da pessoa jurídica de direito privado, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, limitada, no total, a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) por infração;

III – multa diária, observado o limite total a que se refere o inciso II;

IV – publicização da infração após devidamente apurada e confirmada a sua ocorrência; (aplicável aos cartórios)

V – bloqueio dos dados pessoais a que se refere a infração até a sua regularização; (aplicável aos cartórios)

VI – eliminação dos dados pessoais a que se refere a infração; (aplicável aos cartórios)

X – suspensão parcial do funcionamento do banco de dados a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período, até a regularização da atividade de tratamento pelo controlador; (aplicável aos cartórios)

XI – suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período; (aplicável aos cartórios)

XII – proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados. (aplicável aos cartórios)

Obs.: Os incisos VII, VIII e IX foram vetados e não estão em vigor.

Importa salientar que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD poderá aplicar as sanções supracitadas após procedimento administrativo que possibilite a ampla defesa, levando ainda em consideração outros critérios para a aplicação gradativa, de forma isolada ou cumulativa, das sanções, segundo as peculiaridades de cada caso.

O parágrafo 1º, do art. 52, da LGPD, relaciona os seguintes parâmetros e critérios:

 I – a gravidade e a natureza das infrações e dos direitos pessoais afetados;

II – a boa-fé do infrator;

III – a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;

IV – a condição econômica do infrator;

V – a reincidência;

VI – o grau do dano;

VII – a cooperação do infrator;

VIII – a adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes de minimizar o dano, voltados ao tratamento seguro e adequado de dados, em consonância com o disposto no inciso II do § 2º do art. 48 desta Lei;

IX – a adoção de política de boas práticas e governança;

X – a pronta adoção de medidas corretivas; e

XI – a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção.

4. Arpen/BA – A LGPD se mostra como um avanço da tecnologia e da segurança para os atos registrais. Quais informações extraídas dos registros civis são resguardadas pela LGPD?  E de que modo a implementação da LGPD garantiu mais segurança e proteção ao cidadão e aos cartorários nos atos?

Monique Fernandes –  A LGPD é uma Lei principiológica e possui como objetivos: a) proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade; e b) o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. “Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado” (art. 1°, da LGPD). Dentre os conceitos trazidos pela LGPD, entende-se por “dado pessoal – informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável” e “dado pessoal sensível – dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural”. Sendo assim, no que concerne aos Registros Civis das Pessoas Naturais, todos os dados obtidos em razão da atividade, como os extraídos de certidões, por exemplo, são resguardados e abarcados pela LGPD. É importante salientar que não apenas esses, mas todo e qualquer dado pessoal obtido pela Serventia, por meio dos requerimentos realizados pelos usuários, pesquisas de satisfação e, até mesmo, relativo aos próprios funcionários. Logo, nome, telefone, endereço, e-mail, CPF, RG, nome do cônjuge, data de nascimento, dentre outros, devem ser rigorosamente protegidos, especialmente, se enquadrados no rol dos dados sensíveis, como a informação sobre a alteração de gênero, cuja proteção despendida pela lei é ainda maior.

Deste modo, a implementação da LGPD foi fundamental e iniciou uma mudança de cultura e de hábitos no Brasil. A relevância da proteção aos dados pessoais está sendo cada dia mais compreendida e buscada pelos cidadãos e, sem dúvida, a aplicação da lei tem contribuído sobremaneira neste processo. A LGPD é uma lei detalhista e sistemática, e, complementada pelo citado Provimento CNJ n° 134/2022, estabeleceu diretrizes claras para a atuação dos Registradores, direcionando o fluxo de tratamento dos dados para um caminho muito mais restrito, conciso e seguro. A LGPD trouxe regramentos importantíssimos, que auxiliam na conduta dos delegatários, seus prepostos e operadores de dados, mormente, nas etapas de coleta e armazenamento dos dados. Diante da atuação ainda mais criteriosa e ordenada dos Controladores (no caso, Registradores Civis), os atos cartorários tornaram-se mais seguros, garantindo uma tranquilidade maior quer para o Oficial quer para o Usuário.

Fonte: Assessoria de comunicação da Arpen/BA.   

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