Artigo – Métodos alternativos de solução de conflitos nos processos de insolvência – Por Elias Mubarak Junior

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Advogado ressalta a criação do Provimento CG 19/2020, que criou o projeto-piloto para apoio à renegociação de obrigações relacionadas aos empresários, dentre outras questões.

CPC/15, que entrou em vigor em março de 2016, consagrou a tendência de “desjudicialização”, oportunidade em que incitou o Estado-Juiz a estimular a solução dos conflitos por meio de alternativas consensuais, tais como a conciliação e a mediação.

Já o artigo 3º, §3º, o CPC/15 prevê expressamente que “a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”

Como se não bastasse, o legislador inovou e inseriu no codex processual Seção específica sobre a mediação, inclusive determinando que os Tribunais deveriam criar centros judiciários de solução consensual de conflitos, tudo como forma de estimular a autocomposição e prestigiar a razoável duração do processo, direito fundamental insculpido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal.

No mesmo ano de publicação do novo CPC, foi também publicada a lei 13.140/15, que trouxe regramento sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.

O movimento de solução alternativas de conflitos, portanto, é uma realidade (e também uma necessidade) e os operadores do direito devem estar atentos à esse microssistema normativo de métodos adequados de tratamento de conflitos, compostos pelas Lei nº 13.105/15 (CPC), lei 13.140/15 (Lei de Mediação), lei 9.307/96 (lei de Arbitragem) e Resoluções 125/10 e 271/10 e Recomendação 58/19, do Conselho Nacional de Justiça.

Muito embora as Recomendações publicadas pelo Conselho Nacional Justiça não sejam de observância obrigatória, demonstram que existe legítima preocupação com a inserção dos métodos alternativos para se buscar uma solução negociada entre as partes, com o objetivo de evitar que mais demandas sejam distribuídas no já abarrotado Poder Judiciário.

Importante registrar que, apenas no ano de 2019, foram distribuídos 20,2 milhões de novos processos e, conforme pode ser verificado no “Justiça em Números 2020”, publicação do Conselho Nacional de Justiça que contém estudo pormenorizado sobre o funcionamento do Poder Judiciário, verificou-se que, muito embora a política permanente de conciliação apresente lenta evolução, nos últimos 04 (quatro) anos houve expressivo aumento (+30,1%) no número de sentença homologatórias de acordo, passando de 2.987.623 (em 2015) para 3.887.226 (em 2019)1.

Especificamente sobre a utilização de formas alternativas para resoluções de conflitos nos processos de insolvência, a Recomendação nº 58/2019 do Conselho Nacional de Justiça trouxe, como o próprio nome indica, recomendação para que os magistrados responsáveis pelo processamento e julgamento dos processos insolvência (recuperações judicias, extrajudiciais e falências) façam uso da mediação nas seguintes hipóteses:

(i) Incidentes de verificação de crédito, como forma de conferir celeridade na elaboração do Quadro Geral de Credores;

(ii) Auxiliar na negociação de um plano de recuperação judicial que faça sentido para os envolvidos;

(iii) Para que credores e devedores possam pactuar nos casos de consolidação processual e substancial;

(iv) Para solucionar disputas entre sócios/acionistas do devedor;

(v) Em casos de concessionárias/permissionárias de serviços públicos e órgãos reguladores para pactuar sobre a participação de tais entes no processo;

(vi) Situações que envolvam créditos e credores extraconcursais.

A mediação, por outro lado, não poderá ser utilizada na classificação dos créditos e em outros casos em que haja reserva de jurisdição.

No mesmo sentido, o STJ já teve oportunidade de se manifestar sobre a utilização da mediação em processo de Recuperação Judicial ao apreciar a Tutela Provisória 1.409/RJ (originário do processo de Recuperação Judicial do grupo Oi) e também no REsp 1.692.985/SP (originário do processo de Recuperação Judicial do grupo INEPAR).

Em ambas as oportunidades, o colendo STJ prestigiou a utilização da mediação nos processos de insolvência, especialmente porque o CPC dispôs expressamente sobre a necessidade de estímulo de métodos de solução consensual de conflitos e, também, porque a lei 11.101/05 não possui qualquer vedação à instauração do procedimento de mediação no curso dos processos insolvência.

Não é demais lembrar que, no campo normativo, atualmente encontra-se no Senado Federal o PL 6.229/05, que tem como objetivo o aprimoramento e atualização da Lei 11.101/05. No referido projeto de lei existe uma seção exclusiva para tratar sobre mediação em processos de insolvência.

De qualquer forma, entendo que a atual lei de Recuperações e Falências já abarca o modelo de valorização da autonomia privada na solução do conflito, já que são as próprias partes envolvidas no processo que decidem qual a melhor forma de superação da crise, seja negociando o Plano de Recuperação Judicial seja para, ao final, rejeitar o plano e entender que a empresa não mais possui condições de soerguimento.

Por seu turno, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, atento aos impactos que a pandemia do COVID-19 vem causando (e ainda causará) nas empresas e, como forma de minimizar os efeitos negativos, por meio de sua Corregedoria, editou o Provimento CG nº 19/2020, oportunidade em que criou o projeto-piloto para apoio à renegociação de obrigações relacionadas aos empresários, decorrentes dos efeitos da Covid-19, utilizando-se a mediação, como uma forma de desafogar o já congestionado Poder Judiciário.

O Provimento estabelece uma via pré-processual de autocomposição, podendo o devedor encaminhar um e-mail diretamente ao Tribunal de Justiça e requerer a instauração do procedimento de mediação, preenchendo um formulário disponível no próprio site. Após o recebimento do pedido, o ofício judicial agendará uma audiência preparatória e, na mesma oportunidade, designa-se um mediador com experiência empresarial. A atuação do mediador é no sentido de viabilizar uma aproximação entre as partes para a construção de possíveis soluções criativas.

Lembrando que os princípios da mediação devem ser observados e, dentre eles, importante destacar o da boa-fé, confidencialidade e autonomia de vontade.

Segundo o Provimento, o procedimento de mediação deverá se encerrar em 60 dias, oportunidade em que será designada uma audiência de encerramento, levando ao juiz apenas o resultado final das sessões de mediação para eventual homologação.

O instituto vem sendo aplicado em processos de insolvência e tem como objetivo incentivar a solução do conflito por meios alternativos, viabilizando uma aproximação entre credores e devedores, potencializando o diálogo.

É inegável que o Provimento acaba por diminuir a distância entre o Poder Judiciário e os micro e pequenos empresários, uma vez que abre-se uma porta que possibilita a solução alternativa do problema financeiro sem que isso onere ainda mais a empresa em crise financeira.

Para processos judiciais de insolvência já em trâmite, a mediação é uma importante ferramenta e a sua utilização deve ser ainda mais estimulada e, conforme já expresso na Recomendação nº 58 do CNJ, poderá ser utilizada na verificação dos créditos, na aproximação das partes para a construção de um plano de recuperação viável, concebendo agilidade às negociações coletivas, além de ser aplicada à créditos extraconcursais, como forma de viabilizar a manutenção da atividade econômica.

Ponto que considero importante e que é de plena aplicabilidade é que a mediação poderá ser utilizada pelas partes como ferramenta para uma eventual “transformação” do processo (inicialmente) de recuperação judicial para a extrajudicial.

Nesse sentido, CPC vigente, em seu artigo 1902, trouxe também inovação em comparação ao antigo codex. Trata-se do denominado negócio jurídico processual e, em sendo preenchidos os requisitos da Lei 11.101/2005, um processo inicialmente distribuído como de recuperação judicial poderia passar a ser conduzido como extrajudicial, o que traria grandes benefícios econômicos e também na rapidez para solução da controvérsia.

Infelizmente, faltam políticas públicas para as empresas em dificuldades financeiras e, em especial, para aquelas que optaram pelo processo de Recuperação Judicial, devendo os operadores do direito fazer uso de todos as ferramentas atualmente existentes no ordenamento jurídico para auxiliar tanto na superação da crise para o empresário/devedor, quanto para que os credores possam mais rapidamente satisfazerem seus créditos.

Penso que o momento é de pensarmos “fora da caixa” e, assim, apresentar modelos de resoluções alternativas aos conflitos relacionados à insolvência empresarial, prestigiando sempre a legalidade, transparência e celeridade processual.

Para concluir, posso afirmar que a utilização de formas alternativas para resolução dos conflitos nos processos de insolvência, em especial a mediação e conciliação, podem contribuir para que o país saía mais rapidamente da crise, contribuindo para salvar a economia brasileira.

Fonte: Migalhas

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