Artigo – Vamos falar só de custo do Judiciário, não de preço ou de valor

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Em artigo anterior, a propósito da onda de simplificação da linguagem jurídica, escrevi que o relatório da pesquisa Justiça em Números, do CNJ, revelava dois problemas mais importantes e que, antes dessa preocupação com a redação de petições ou decisões em juízo, merecem a atenção daquele conselho.

Disse, ainda, que esses problemas pediam, para serem melhor tratados, outro artigo e então apontei: primeiro, o elevado custo do Judiciário brasileiro; e segundo, a desproporção entre o custo do Judiciário estadual, federal e do Trabalho em relação à demanda de processos para julgamento.

Lembro, ademais, que concluí provocativamente afirmando que esses problemas têm solução.

Continuando daí, esclareço logo, para evitar percepções equivocadas, que emprego a palavra custo como sinônimo de gasto, compreendendo, portanto, o custo propriamente dito e demais despesas, ou seja, de modo ampliativo do conceito dado pela contabilidade empresarial, como sendo o total dispendido anualmente pela sociedade brasileira com o Judiciário, sem visualizá-lo como preço e nem como expressivo de valor.

Em decorrência, digo também que não objetivo aqui tratar de custas processuais, assunto que envolveria considerações de ordem diversa, o que certamente alongaria este artigo em demasia.

1% do PIB e o risco à sustentabilidade
Sigo, então, mencionando que o exame refinado nos números da série histórica do custo do Judiciário, além de revelar ter havido um decréscimo significativo nos anos de 2020 e 2021 – retornando à linha ascendente em 2022, porém em montante inferior ao alcançado em 2019 – o relatório da pesquisa indica que deduzidos os desembolsos com inativos e pensionistas, “o gasto efetivo para o funcionamento do Poder Judiciário é de R$ 94,4 bilhões […] e representa 1% do PIB”.

Referido assim esse custo, procura-se demonstrar que não chega a ser excessivo.

Números, entretanto, são signos de quantidade e, portanto, admitem ajustes tendentes a qualificá-los de modo diverso do que têm em realidade.

No caso, essa exclusão da conta com aposentadorias e pensões, além de não ser da melhor técnica para retratar o total efetivo do custo do Judiciário, é absolutamente desnecessária por que, embora elevado — representando em 2022, segundo o mencionado relatório (sem incluir gastos com o STF e o CNJ), 1,2% do PIB brasileiro, gasto superior em comparação com a maioria dos países do mundo — não chega a ser demasiado ou exorbitante.

Não obstante, a retomada da curva ascendente a partir desse ano indica que, caso não sejam adotadas políticas para reduzi-lo ou, pelo menos, estabilizá-lo no patamar atual, poderão ser enfrentados ruídos de sustentabilidade no futuro.

Portanto, em face dessa sinalização, enquanto encarregado do planejamento estratégico do Poder Judiciário Nacional, deve o CNJ priorizar estudos e adotar medidas preventivas a respeito.

Iniciativas para desjudicialização
Pois bem.

Para alcançarmos a redução das despesas do Judiciário ou, pelo menos, sua estabilização em patamar adequado, em primeiro lugar, parece-me necessário reverter a prática “do pura e simples mais informática e, de modo concomitante, mais gente”, que, aliás, já se tornou um vezo de todo o serviço público brasileiro.

O mais importante é, porém, darmos maior impulso à política de desjudicialização que tem avançado com leis como, por exemplo, a que permitiu o protesto de CDAs; a que dispôs sobre a usucapião extrajudicial; a que criou adjudicação compulsória extrajudicial; a que introduziu a execução extrajudicial de hipoteca e nos casos de alienação fiduciária de imóveis; e a que trata da mediação, da conciliação e da arbitragem, sem exclusividade, no âmbito dos Tabelionatos de Notas.

A publicação “Cartórios em Números”, 5ª ed., 2023, editada pela Anoreg/BR, demonstra com dados estatísticos os êxitos alcançados em decorrência dessa política de desjudicialização, não só na prevenção de demandas judiciais, como na agilização de soluções extrajudiciais para atos ou pretensões compreendidos na chamada jurisdição graciosa, contribuindo para desafogar o Poder Judiciário com grandes resultados de economicidade.

A delegação da prática de atos e procedimentos tipicamente administrativos compreendidos na jurisdição voluntária ou graciosa à atividade notarial ou registral, ao lado de não mais se criarem órgãos judiciais para exercê-los, nada retira, afeta ou diminuí as competências constitucionais do Poder Judiciário que se encontra duplamente assegurada (artigo 5º, XXXV, e 236, § 1º, parte final, da Constituição da República).

Aliás, no que se refere a medidas que contribuem para desonerar o custo do nosso Judiciário, cito, também como exemplo merecedor de aplauso, no âmbito de competência do CNJ, a recente Resolução nº 547, de 22/2/2024, que instituiu tratamento racional e eficiente das execuções fiscais de baixo valor, em cumprimento da orientação firmada, em repercussão geral, pelo STF (Tema 1.184).

De outra banda, já se tornou imprescindível promover estudos para ajustar as estruturas físicas e de gestão de pessoas dos diversos segmentos do Judiciário (especialmente da Justiça Estadual, Federal e do Trabalho), à demanda de processos, tendo em conta a nova realidade resultante da informatização crescente, a política de desjudicialização e, sobretudo, as mudanças que já se fazem sentir no tão falado predomínio da cultura do litígio no Brasil.

Considerações finais
O Judiciário brasileiro é, sem margem para dúvida, um dos melhores do mundo, não só pelos seus procedimentos de recrutamento de recursos humanos (magistrados e corpo auxiliar). Merece ser assim reconhecido também pela sua produtividade, considerada pelo número de processos baixados, vale dizer, resolvidos em definitivo que, em 2022, ultrapassou 30,3 milhões.

Nem por isso, se torna irrelevante ou adiável racionalizar melhor o seu custo no futuro, isto é, pensar meios ou políticas para tornar menos elevados os dispêndios da sociedade para mantê-lo, o que, com todo respeito aos que pensam de modo diverso, não significa analisar essa relevante matéria sob a ótica de preço (simplista) e de valor (complexa).

Fonte: ConJur

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