“Os Provimentos nº 151, 152 e 153 reafirmam a segurança jurídica dos atos realizados nos cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais do Brasil”

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Beatriz Britto é advogada e pós-graduada em Direito Registral e Notarial

As inovações normativas trazidas pelos provimentos 151, 152 e 153 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicados no último dia 28 de setembro, promoveram alterações significativas na atuação dos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais. Desde então, os impactos desses provimentos têm sido foco de discussões e análises por especialistas da área e, assim, destacam-se a regulamentação do registro de nome de natimorto, aprimoramento das regras para alteração de nome e gênero de pessoas transgênero e a regulamentação da alteração do nome perante o Registro Civil das Pessoas Naturais.

Em entrevista exclusiva à Arpen/BA, a advogada e pós-graduada em Direito Registral e Notarial, Beatriz Britto, pontuou as principais alterações trazidas pelos provimentos 151, 152 e 153 do CNJ. Leia abaixo a entrevista completa:

Arpen/BA – Qual a importância desses provimentos para a normatização nacional da atuação do registro civil? De que forma os provimentos trazem mais segurança para a atuação extrajudicial?

 

Beatriz Britto – O Conselho Nacional de Justiça ciente da importância da prestação de serviços à população e notando a necessidade de uniformizar os procedimentos realizados pelos Cartórios, vem reorganizando o sistema cartorial, por meio de Provimentos. Sendo assim, os Provimentos nº 151, 152 e 153, editados no ano 2023, reafirmam a segurança jurídica dos atos realizados nos cartórios do Brasil, visto que padronizam as atividades oferecidas pelos Ofícios de Registro Civil das Pessoas Naturais, além de esclarecer e descrever quais caminhos os delegatários devem percorrer para realizar tais atos, como: alteração do prenome, sobrenome e/ou gênero, etc.

 

Arpen/BA – Quais as principais mudanças trazidas com os provimentos para a atuação cartorária registral baiana?

 

Beatriz Britto – Os Provimentos nº 151, 152 e 153/2023 do CNJ aprimoraram as normativas já existentes sobre as matérias em comento, assim simplificando os procedimentos, promovendo a desjudicialização e facilitando a vida dos cidadãos.

Em suma, as principais mudanças trazidas com os Provimentos para atuação cartorária registral baiana foram:

  1. Os pais poderão averbar o nome no caso do registro de natimorto, de forma retroativa a data do Provimento;
  2. O procedimento de alteração de prenome e/ou gênero da pessoa transgênero poderá ser iniciado em serventia diversa da competente para o ato e no Cartório de Registro Civil diverso em que se lavrou o assento de nascimento;
  3. A possibilidade de o brasileiro naturalizado realizar a alteração de prenome, e/ou gênero, e/ou sobrenome;
  4. A possibilidade de o brasileiro que reside no exterior realizar a alteração de prenome, e/ou gênero, e/ou sobrenome, frente à autoridade consular;
  5. Finalizado o procedimento de alteração do prenome, o registrador que realizou a alteração comunicará eletronicamente, por meio da CRC, sem qualquer custo, o ato aos órgãos expedidores do RG, CPF, título de eleitor e passaporte;
  6. Em até quinze dias após o registro de nascimento, qualquer dos pais poderá apresentar, perante o Registro Civil em que foi lavrado o assento de nascimento, oposição fundamentada ao prenome e/ ou sobrenomes indicados pelo declarante, assim, indicando o nome substituto e os motivos dessa opção. Situação essa que por não se tratar de erro imputável ao Oficial, em qualquer hipótese, serão devidos emolumentos pela retificação realizada;
  7. Se aquele cujo sobrenome se pretenda alterar for pessoa incapaz, no caso de incapacidade por menoridade, esta poderá ser feita por meio de requerimento escrito formalizado por ambos os pais, admitida a representação de qualquer deles mediante procuração por escritura pública ou instrumento particular com firma reconhecida, cumulativamente com o consentimento da pessoa que for maior de dezesseis anos;
  8. A alteração de sobrenome, por ser um procedimento eminentemente documental, poderá ser realizada pessoalmente no Cartório de Registro Civil ou por videoconferência em todas as formas.

Arpen/BA – O provimento 151 trouxe a possibilidade e o direito dos pais registrarem nome do natimorto anteriormente feito sem essa informação. Assim, o registro de prenome e nome de natimorto no estado já era previsto antes dos provimentos do CNJ?

Beatriz Britto – O Provimento nº 151/2023 do Conselho Nacional de Justiça abordou acerca do registro do natimorto, assim, demonstrando humanidade ao possibilitar que os pais realizem a averbação do nome nos registros que foram lavrados anteriormente sem essa informação, desta forma, assegurando aos respectivos genitores que a sua criança não será esquecida e garantindo a mesma o direito a ter seu nome registrado, independente das circunstâncias.

Quanto ao nome do natimorto, constata-se uma diversidade de tratamento entre as normativas, assim, expressamente, na Bahia, através do Provimento Conjunto nº 11/2020 da CGJ/CCI, fora especificado que nos registros de natimorto, os quais são lavrados no Livro C-Auxiliar, constará os dados que couberem e poderão ser indicados prenome e sobrenome do registrando pelos pais.

Desta forma, no que diz respeito a esta matéria, o nosso Estado já se encontrava em conformidade com as diretrizes estabelecidas pelo Provimento editado pelo CNJ.

Arpen/BA – Qual o impacto do capítulo do provimento 151 que trata do procedimento de promoção do registro de nascimento em casos de omissão? De que forma o provimento assegura a promoção desse registro para a criança ou adolescente?

 

Beatriz Britto – O capítulo que trata sobre o procedimento de promoção do registro de nascimento no caso de omissão apresenta um impacto muito positivo, tendo em vista que por meio deste registro o juízo da infância e juventude irá assegurar a proteção integral e garantir o direito da personalidade da criança ou adolescente. Além disso, o Conselho Nacional de Justiça traz a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC como um instrumento do poder judiciário, meio pelo qual este poderá realizar consulta, solicitações, encaminhamentos etc.

Nesse sentido, o juízo deve se certificar sobre a inexistência de registro de nascimento da criança ou adolescente através da CRC; da mesma forma é indicado que, preferencialmente, os mandados judiciais que determinarem o registro de nascimento sejam encaminhados eletronicamente aos Oficiais de Registro Civil através desta central, ou por outro meio que também permita a comprovação da recepção pela serventia.

Ainda, quando não identificado o nome atribuído à criança ou adolescente pelos genitores, o Juiz deve adotar providências, no que couber ao caso concreto, como: determinar a produção de provas e diligências necessárias à instrução para identificar dados qualificativos da criança ou do adolescente e de seus familiares, a fim de conceder a ela um nome que seja significativo à sua história de vida e ao seu direito à identidade; quando o nome de familiares for conhecido, cabe verificar se não há registro civil da criança ou adolescente em outra localidade; averiguar se àquela criança ou adolescente não é desaparecido, consultando os bancos de dados da polícia, inclusive genéticos; e nos casos da criança ou adolescente já saberem se expressar, estes possuem o direito de ser ouvidos para que informem por qual o nome se identifica.

Nesta senda, o Juiz ao atribuir o nome completo da criança ou adolescente, observará os seguintes critérios: uso de nome mais comum e usual no Brasil; na designação do sobrenome, devem ser respeitadas as circunstâncias locais, históricas e pessoais do caso concreto; devem-se evitar homonímias; que prevaleça o nome pelo qual a criança ou o adolescente declara identificar-se; que seja vedado atribuir nomes que exponham ao ridículo, constrangimento, que possibilite o pronto motivo daquele registro ou relacionem as pessoas de projeção social, política, religiosa ou qualquer outra de fácil identificação, ainda que somente em âmbito local.

Por fim, realizado o registro, deverá o Registrador Civil, no prazo de cinco dias, remeter eletronicamente a certidão de nascimento ao juízo mandante para juntada nos autos. Logo, vislumbra-se que o Provimento trouxe instruções específicas e passos que devem ser seguidos de acordo com a realidade de cada criança e adolescente.

  1. Arpen/BA – De que forma a alteração de nome e gênero ou de ambos de pessoas transgênero , que já é uma realidade nacional, foi aprimorada com o provimento 152?


Beatriz Britto –
O Provimento nº 152/2023 do Conselho Nacional de Justiça, dispõe de regras específicas para alteração de prenome e/ou do gênero de pessoa transgênero, dessa maneira apontou que os pedidos podem ser feitos em qualquer Cartório ou Ofício de Registro Civil das Pessoais Naturais. À vista disso, prescreveu que se o requerimento for realizado em serventia diversa daquela que lavrou o assento de nascimento, a solicitação será remetida entre os cartórios para averbação pelo módulo e- Protocolo da Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC, assim, não gerará custos adicionais além dos emolumentos legalmente previstos para a prestação do serviço em ambos os cartórios.

Ainda mais, foi revogado o Provimento n° 73/2018 do CNJ, o qual estava em desacordo com a Constituição Federal e a Convenção Americana de Direitos Humanos, uma vez que trazia a apresentação de laudos médicos ou psicológicos para comprovar a transexualidade.

Nesta senda, vale citar que esse cenário foi modificado após a histórica decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, junto a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4275, em que foi reconhecido o direito às pessoas transgêneras de realizar a alteração do seu prenome e sexo diretamente no Cartório de Registro Civil. Desse modo, a Suprema Corte afirmou a desnecessidade autorização judicial, bem como preceituou que o exercício de tal direito independe da cirurgia de transgenitalização, ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes.

Ainda, cabe destacar que o Provimento supramencionado também abordou que a alteração de prenome e/ou gênero do brasileiro residente há mais de cinco anos no exterior poderá ser realizada perante a autoridade consular brasileira. Ademais, foi incluída nesta normativa a figura do brasileiro naturalizado, assim também possibilitando que este realize a alteração do seu prenome e/ou gênero.

Por fim, foi determinado que enquanto não for editada legislação específica no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, o valor dos emolumentos para o procedimento de alteração de prenome e/ou sobrenome será o correspondente ao procedimento de retificação administrativa, ou, em caso de inexistência desta previsão específica em legislação estadual, de 50% (cinquenta por cento) do valor previsto para o procedimento de habilitação de casamento.

Arpen/BA – O provimento 153, por sua vez, prevê a alteração extrajudicial do nome civil de um indivíduo. Como ele se difere do provimento 152, e há similaridade entre os dois?

 

Beatriz Britto – Cabe citar, inicialmente, que a luta pelo direito da alteração de prenome e gênero das pessoas transexuais estendeu-se aos cidadãos, uma vez que as normativas foram estabelecidas e possibilitaram também a alteração extrajudicial do prenome e sobrenome de todos.

A Lei nº 14.382/2022 trouxe alterações na Lei de Registros Públicos, quanto à matéria em comento, não fora abordado pelo legislador como os Oficiais deveriam realizar tais procedimentos, logo por analogia seguiam o que estava determinado no Provimento nº 73/2018 do CNJ. Diante disso, nota-se a importância do Provimento nº 153/2023 do Conselho Nacional de Justiça, posto que discorre regras e diretrizes que devem ser observadas nestes atos, portanto, traz mais segurança jurídica ao serviço executado pelo Cartório de Registro Civil.

Sendo assim, em linhas gerais, foi exposto neste regulamento a concepção do nome no momento do nascimento, por exemplo, disserta sobre a alteração do prenome e/ou sobrenome em até 15 dias após o registro de nascimento daquela criança, em que qualquer dos pais poderá apresentar, perante o Cartório em que foi lavrado o assento de nascimento, oposição fundamentada, além de que deve indicar o nome substituto e os motivos dessa opção. Diante disso, como não se trata de erro imputável ao Oficial, os emolumentos serão devidos pela retificação realizada.

Já na alteração de prenome, a partir dos 18 anos, poderá a pessoa requerer diretamente ao Oficial de Registro Civil das Pessoais Naturais a modificação, independente de motivação e/ou de decisão judicial. No entanto, na hipótese de o Oficial suspeitar de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade ou simulação quanto a real intenção do requerente, fundamentadamente, recusará a alteração e, caso o requerente não se conforme, poderá, desde que solicitado, encaminhar o pedido ao Juiz Corregedor competente para decisão.

Para mais, o Provimento nº 153/2023 do CNJ, disciplina que quando o sujeito realiza a alteração de prenome nas hipóteses de pessoa transgênero é vedada uma nova alteração extrajudicial. Por conseguinte, o procedimento da alteração de prenome e/ou gênero da pessoa transexual é sigiloso, já a alteração de prenome que trata o capítulo da Seção III, do Provimento supracitado, tem natureza pública.

Outrossim, foi postulado que se aquele cujo sobrenome se pretenda alterar for pessoa incapaz, em virtude da idade, a alteração poderá ser realizada por meio de requerimento escrito formalizado por ambos os pais, admitida a representação de qualquer deles mediante procuração por escritura pública ou instrumento particular com firma reconhecida, cumulativamente com o consentimento da pessoa se esta for maior de dezesseis anos. Ademais, a alteração de sobrenome, por ser um procedimento eminentemente documental, poderá ser realizada pessoalmente no Cartório de Registro Civil ou por videoconferência em todas as formas.

Ante o exposto, observa-se que os Provimentos nº 152 e 153/2023 do CNJ possuem procedimentos simétricos, já que não existem ruídos entre eles, a exemplo das certidões que devem ser apresentadas para que ocorra a alteração do prenome, como: certidão de nascimento atualizada; certidão de casamento atualizada se for o caso; certidão do distribuidor cível do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal); certidão do distribuidor criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal). Para culminar, na seção VI, da situação transnacional, também é permitido que o brasileiro naturalizado e o residente no exterior realizem a alteração de seu prenome e/ou sobrenome.

 

Arpen/BA – Quais os pontos positivos que o provimento 152 abarcou para a população LGBTQIAP+?

 

Beatriz Britto – O Provimento nº 152/2023 do CNJ abriu um leque de possibilidades para a população LGBTQIAP+, uma vez que o procedimento de alteração de prenome e/ou gênero da pessoa transgênero pode ser realizado em qualquer Cartório ou na Serventia de Registro Civil que lavrou o assento de nascimento ou diversa. Além de que, a figura do brasileiro naturalizado foi introduzida neste regulamento, assim possibilitando que este faça a sua alteração do prenome e/ou gênero. Ainda, foram dispostos os requisitos para que o procedimento de alteração de prenome e/ou gênero seja executado por brasileiros que estão no exterior.

Diante disso, percebemos a preocupação do Conselho Nacional de Justiça de uniformizar as normas e procedimentos para realização da alteração de prenome e/ou gênero da pessoa transgênero, como também torna efetivo o direito à identidade dessa comunidade, classe esta que luta constantemente para que suas garantias constitucionais sejam respeitadas e tratadas com igualdade.

Fonte: Assessoria de comunicação da Arpen/BA.

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